Quando se sabe que Martin Scorsese lançou um novo filme, não tem cinéfilo que não se ponha curioso e ansioso já que a filmografia de um dos maiores diretores contemporâneos é algo pra lá de mais que respeitável em todos os aspectos fílmicos e, #AssassinosdaLuadasFlores chega para comprovar, mais uma vez, a excelência de Scorsese na sétima arte.
Adaptando o livro homônimo de 2017, Scorsese roteiriza fatos macabros e obscuros da história americana na virada do século 20, criando uma narrativa coesa, multifacetada e épica onde mistura com maestria registro histórico, tragedia romântica recheada de suspense, muito do gênero faroeste, investe em estudo de personagens e, acima de tudo não só respeita, representa e homenageia as tradições milenares de um povo indígena, inserindo camadas metalinguísticas memoráveis.
Com quase três horas e meia de duração (e não podia ser menor), a trama acompanha a infame, mas infelizmente nada nova, exploração do colonizador sobre o colonizado – principalmente de cor diferente - e a espoliação abjeta de suas riquezas (e vidas), através de descarados e nem sempre sutis estratagemas orquestrados pela ganancia motivada por uma rara inversão social onde o colonizador branco era muito inferior monetariamente a rica sociedade composta pela minoria étnica.
Com Leonardo Di Caprio, Robert De Niro e a soberba Lily Gladstone encabeçando um elenco que agrega excelentes coadjuvantes e centenas de figurantes, essa tensa história se engrandece ainda muito mais por conta da perfeita ambientação de época, pelos estupendos e significativos figurinos, uma fotografia soberba tanto nos exteriores e interiores (vale assistir novamente só para usufruir melhor dela), pela câmera lenta percorrendo ambientes em magníficos planos-sequências, e uma trilha sonora gloriosa composta de flautas, tambores gaitas e vocalizações que fortificam a identidade cultural do povo retratado.
O trabalho de iluminação, também, com algumas superposições, é um capítulo à parte e, todos esses impressionantes elementos fílmicos citados acima chegam para abrilhantar a narrativa sendo tão naturais como pertinentes ao reforço do contexto.
Por fim, embora muito, muito mais poderia ser escrito sobre a importância e magnificência dessa obra, não o farei pois é algo pra ser visto e palavras não bastariam. Devo ressaltar que quando Scorsese acha necessário explicitar a violência ele o faz de forma gráfica mesmo, sem camuflagens que poderiam ofuscar a natureza bestial dos assassinos e isso pode impactar estômagos mais sensíveis.
Mas há um refrigério! Quando a justiça finalmente resolve investigar o caso, essa história recai sobre culpas individuais e assistimos os responsáveis vivenciando seus purgatórios o que não é suficiente já que no genial, surpreendente e metalinguístico epílogo não redime nossa alma deixando-a com uma sensação de melancolia provocada pela dramatização dos eventos narrados.
Repito: Há muito mais pra ser dito como os primeiros caracteres a aparecerem nos créditos finais serem da língua Osage, numa clara demonstração de respeito a essa cultura, mas ficarei por aqui para não estragar a experiencia dos privilegiados que irão ver em tela grande essa ode ao verdadeiro Cinema.
Comments