Custódia é um daqueles filmes que tanto o título, quanto a sua sinopse – um menino, filho de um casal em meio a um divórcio conturbado, tenta equalizar a relação para evitar conflitos mais graves – não condizem com o que é projetado na tela, e a dicotomia entre o que se expecta, e até se vê durante boa parte da trama, e o seu desenlace é, em todos os níveis, frustrante.
Não que o roteiro de Xavier Legrand, e a sua direção, não tenham os seus momentos, até os têm, mas esses pervertem completamente as suas potência e delicadeza, quando descambam, progressivamente, a narrativa para um discurso maniqueísta e perigoso, e transforma o que deveria ser um singular drama social-familiar em um suspense faccioso e insensato.
O enredo começa instigante em uma audiência de conciliação entre a mãe, que acusa, sem provas, o ex-marido de violências e quer a guarda total de seu filho mais novo, e o pai, indignado pela impossibilidade de ver e falar com o filho, que quer a guarda compartilhada. A juíza delibera a favor do pai forçando o menino a ficar com ele um fim de semana a cada quinze dias, até que tenha se estabelecido na cidade e possa exercer a guarda compartilhada, propriamente dita; e procede muito bem às visitas que revelam uma relação muito mal resolvida entre os pais e comportamentos extremos de ambas as partes, naturalmente, justificados pelas rusgas que permeiam as interações entre os dois, mas que ainda mantêm a proporcionalidade, desprezando o comportamento refratário da filha, por mais que suas ações sejam questionáveis. Entretanto, percebe-se gradual agudizar dos arbítrios do pai, desequilibrando as tensões e derivando a narrativa para os suspenses em seu quarto final, estabelecendo em sua tese, o pai, o homem, como o mal, e a mãe, a mulher, não como o bem, mas como a vítima. As sequências finais, já de um thriller, rompem com o discurso erigido até então de um drama familiar, que tomba em maniqueísmo banal, que em tempos de #metoo, ressoa temerária e levianamente.
A A direção de Xavier tem seus altos, como a cena em que a filha mais velha faz o teste de gravidez na escola, um potencial conflito, infelizmente, não explorado, mas se perde em cenas longas, como a da mãe e do filho histéricos dentro da banheira. Denis Ménochet e Léa Drucker estão ótimos como Antoine e Miriam Besson. Tanto Thomas Gioria, como o menino Julien, quanto Mathilde Auneveux, sua irmã Josephine, são gratas surpresas. Fotografia, música, som e edição são muito bons.Um roteiro que estabelece teses reais e contundentes, para a seguir descambar em hipóteses um tanto tendenciosas, é o que nos apresenta Xavier Legrand com Custódia, que parece não considerar que o mal e o bem estão em todos os lugares, e que psicopatas existem de todos os sexos, sexualidades e identidades de gênero, e ao assumir a culpabilidade de um dos pais, toma a pior decisão dramatúrgica possível. Decepcionante a dualidade entre o discurso nos três quartos iniciais e o suspense no final.PS: Em cartaz.
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